quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Paschoal Motta: De um diário ocasional


 Crônica de um poeta falando da sua iniciação lírica ouvindo o Poeta da Vila, nos "cafundós" da Zona da Mata, ou melhor, em São Pedro dos Ferros! 
 MTP

 DE UM DIÁRIO OCASIONAL

Estou em São Pedro dos Ferros. Tem um bar perto e vez por outra vou lá tomar algumas, papear e jogar sinuca... De noite, calor, quase 23 horas. Aí para um carro, e o motorista se integra a amigos dele na calçada. E, para variar, liga o indefectível "som" e, para não perder o costume, a todo volume com dessas "músicas" que dominam e bombam audiências... E, para ficar tudo de conforme,o filhote do paizão canta a toda goela com o "cantor" do som do carro. A educação musical também deve  ser de berço... Eta ferro! Tinha de ver o entusiasmo do pequeno ferrense: "... ai que vontade de morrer / se eu não ter seu coração / se não quer me amar...
O menino, uns 10 anos, no máximo, gritava ao pai, gritava para mostrar que ele também sabia fazer bonito, enquanto tomava fôlego... Penso com meu copo de cerveja: isso é no Brasil, do Oiapoque ao Chuí...

Cortar para outro menino, também de dez anos, lá nos cafundós da Zona da Mata Mineira, por coincidência, escutando Almirante narrando a vida do Poeta da Vila (Isabel) e apresentando, de entremeio, composições do moço carioca, que cascou no cerrado o mais depressa que conseguiu... E o menino interiorano não tinha ainda rádio em casa. Toda quarta-feira, de noite, pedia à mãe para ir escutar na casa da irmã o programa que o tinha fisgado e o irá moldar, esteticamente, pelos tempos vindouros... E ele também cantava, quase em silêncio, para decorar as letras do Poeta da Vila..."Quem acha vive se perdendo / por isso a agora vou-me defendendo / da dor tão cruel de uma saudade... /// Quando o apito da fábrica de tecidos / vem ferir os meus ouvidos / eu me lembro de Você... /// Nosso amor que eu não esqueço / e que teve seu começo / numa festa de São João... /// Pra que mentir, / se tu ainda não tens a mania / de toda mulher... / se eu sei que gostas de outro / que te diz que não te quer...
E aquele menino, que nem tinha rádio em casa, ficava, antes de dormir, de ouvido fora do travesseiro, antenado, para captar algum raro rádio que trasmitisse algum samba do Poeta da Vila, e ele pegasse mais algum verso para completar o que até então tinha decorado...E conseguia. E sem querer, por simples coincidência, afinava o ouvido numa cadência...Logo depois, ele ia conhecer Castro Alves...  Auriverde pendão de minha terra / que a brisa do Brasil beija e balança...
A cabeça não cabia tanto, e o menino ia entulhando a fala nacional num ritmo, num envolvimento, numas estruturas, numas expressividades, nuns encantos, nuns encantamentos, e ele também começava a imitar e chamar de poemas... para seguir menino.
PM, 28-10-2012

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Auto - Educação, Parte II





Citações e comentários feitos por Ronei Pezzini


"Nessas minhas andanças apareceram alguns MARCOS, pontos angulares, desviando minha consciência para uma direção diferente da que décadas de ensino padrão mais um pouco de curiosidade e rebeldia (de então) estavam guiando.
Citarei alguns, pois não tenho espaço para dar às obras o tratamento que merecem. Cabe aos interessados escolherem aprofundar e principalmente escolherem se deixam ou não se influenciar por elas."




1) Zeitgeist (documentário livre)


Link: http://www.zeitgeistmovie.com


Excelente documentário feito por Peter Joseph, lançado para download gratuito em vídeo e que cativou minha curiosidade a ponto de seguir o site e absorver mais informações a respeito. De maneira alguma concordo com tudo que ele disse - leia essa frase mais duas ou três vezes, por favor. Leu? Então, como dizia, de maneira alguma afirmo ser verdade tudo o que ele diz, mas uma coisa eu tenho que tirar meu chapéu: é um chamado ao QUESTIONAMENTO. Aos perigos de aceitarmos tudo sem nos aprofundarmos.


No fórum do site, vi uma excelente resposta do próprio Peter Joseph a um post que criticava e apontava erros sobre o Egito Antigo e mesmo sobre a Bíblia - ele agradeceu ao interlocutor por ter duvidado, falando que o moto do artigo era sobre QUESTIONAR as informações que recebemos, mesmo que esse questionamento seja contra o próprio texto (e vídeo) dele. Apenas pediu que, se a pessoa quer de fato refutar o que ele disse, com todas as referências literárias e de pesquisas reais (referências em enorme quantidade e que ele publicou e pediu aos seguidores que confirmassem por si mesmos), que não viesse armado apenas de wikipedia e alguns sites ou grupos tendenciosos da opinião contrária; que venha com textos de cientistas válidos e que em suas obras abriram espaço para o contraditório. Questionar citações que falam mal da Bíblia citando a própria é no mínimo um contra-senso.


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2) Anexos do livro Estado do Medo e demais comentários sobre Ambientalismo pelo Dr. Michael Crichton, médico formado em Harvard e que acontece de ser TAMBÉM um escritor de techno-thrillers:


Link 1: http://www.crichton-official.com/essay-stateoffear-whypoliticizedscienceisdangerous.html


Link 2: http://scienceandpublicpolicy.org/commentaries_essays/crichton_three_speeches.html


O que ele conclui depois desse que é mais um (bom) livro de ficção, um techno-thriller, vale para abrirmos nosso olhos em relação ao que pensamos, e mesmo como somos manipulados. Estressa temas como a falta de certeza que muitas pessoas - inclusive cientistas - têm, mas ainda publicam seus artigos como se fossem verdades sólidas.


Critica a completa falta de responsabilidade da imprensa - termo aqui usado para explicar que a imprensa não é punida por danos que suas informações quando falsas possam causar, por histerias em massa que suas dramatizações para efeito de resposta emocional possam incutir no imaginário dos espectadores ou em geral simplesmente por poder INVENTAR o que quiser sem que seja obrigada a desmentir ou se desculpar por isso.


Indo além, mostra que existe uma arrogância dos ditos “especialistas” a respeito do que de fato conhecemos e critica as estatísticas que são repetidas por outras emissoras pois “já está escrita em uma publicação, só pode ser verdade”. Especiais menções para a história da criação do que ele chama de "primeira reserva ecológica do mundo" o Parque de Yellowstone, onde uma sucessão ininterrupta de erros catastróficos com propósitos benéficos atrapalhou a conservação local mais do que se houvéssemos deixado a mata como estava; e para a estatística de quantas espécies animais são extintas a cada ano, sendo que NINGUÉM SABE quantas espécies existem no mundo, rendendo a tal estatística um valor de veracidade nulo.


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3) Mera Coincidência (filme)


Link: http://www.imdb.com/title/tt0120885/?ref_=fn_al_tt_1


A formação de um ideal no imaginário popular e a manipulação das informações pelas estruturas do poder. Menção honrosa para a força dos diálogos, onde você perde muita informação (e ironia brutal) se piscar o olho. "Ele acabou com a guerra? Por quê alguém iria querer fazer isso?"


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4) Razões para a Guerra (documentário)


Link: http://www.imdb.com/title/tt0436971/


Mostra uma previsão acertada feita pelo então presidente dos EUA, Dwight Eisenhower, ainda em 1961, sobre o Complexo Militar-Industrial. Lá vemos como as guerras são criadas, em certo ponto reafirmando coisas vistas em Zeitgeist e no próximo item...


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5) Tiros em Columbine (documentário)


Link: http://www.imdb.com/title/tt0310793/


Tenho uma certa antipatia quando o Michael Moore quer ser mais visto do que o assunto do qual ele está tratando, não gosto da forma aparentemente falsa como ele tenta criar empatia resultando em um embaraço sem sinceridade mas acho inegável muito do que ele diz. Essa obra começou como uma análise do amor americano pelas armas, partindo do massacre em Columbine High, mas como ele diz nos extras, a coisa foi evoluindo para uma conclusão diferente do que ele esperava.


O ponto que muda o foco do documentário é a descoberta e análise da estatística (válida para 2002, quando foi lançado) de que o CRIME havia diminuído em 30% mas A COBERTURA MIDIÁTICA DO CRIME havia aumentado em 600% no mesmo período. Destaque para uma das melhores entrevistas que ele fez, com o roqueiro Marilyn Manson.

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Ronei Pezzini: Auto-Educação



A visão de um jovem que hoje já está na fase madura, vai focar, na segunda parte a ser postada, as leituras que o influenciaram na sua chamada auto-educação. Ronei é um leitor ávido desde criança. Inteligência brilhante. Aguardo ansiosa, seu livro.
MTP 

Existem diversos marcos na minha auto-educação, aquela que eu assumi após as instituições de ensino e pregações da sociedade cessarem sua influência modificadora em mim. Não que estas estejam erradas, longe de mim ser aquele jovem rebelde querendo transgredir apenas pela transgressão, apenas que educação formal e informações da sabedoria popular todos nós devemos (ou ao menos deveríamos) ter. Também não quero dizer que tal pressão social algum dia acaba, apenas que ela não mais me forçava a fazer ou a pensar da forma como tentavam convencer, vender ou mesmo enganar a si mesmos querendo nos levar junto.

Não, eu estou falando depois de completada a etapa acadêmica que nos dispusemos a fazer - seja ensino primário, terciário, plenipotenciário ou penitenciário, o sabor da sua escolha. Estou falando de depois dos nossos tios ou vizinhos, primos ou coleguinhas do curso de windows-word-excel acharem que não há nada mais para nos ensinar, que estamos prontos. Ok, exagerei aqui, visto que é uma impossibilidade prática atingir tal consenso. Consideremos então que estou falando de depois que eles concluam que não temos mais esperança, somos um caso perdido e assim, sem avisar, nos deixam em paz. Quando caímos no mundo como um indivíduo não como um projeto de pessoa-modelo (que na verdade não existe), por assim dizer.

A partir desse ponto, cada um de nós pode ESCOLHER o que quer aprender, focalizar sua curiosidade aonde bem entender, sem ter uma legião de "coleguinhas" aprendendo ou pelo menos sendo expostos às mesmas informações como vinha acontecendo desde a escolinha. O que eu escolhi ler não necessariamente é escolhido pelos que caíram nesse conjunto-universo ao mesmo tempo que eu e assim a partir daí a nossa educação passa a ser individual, exclusiva, apenas para nós.

Dessa forma fui seguindo, sendo um leitor ávido em relação a alguns de meus pares (se o critério a se obedecer for o da quantidade) ou sendo um leitor limitado para muitos (ao se levar em conta a temática pouco diversificada, por ter largado o chato do Sartre, por nem ter pensado em ler Nietsche ou como se soletra?, por considerar Baudelaire ou Tchekov nomes bacanas para citar, mas que nunca li).

Eis que nessas andanças apareceram alguns MARCOS, alguns pontos angulares, desviando minha consciência para uma direção diferente da que décadas de ensino padrão mais um pouco de curiosidade e rebeldia (de então) estavam guiando.

 Ronei Pezzini

domingo, 30 de dezembro de 2012

Carlos Drummond de Andrade: Receita de Ano Novo




Há 110 anos nascia Carlos Drummond de Andrade. Orgulho para Minas e para o Brasil. Sua obra é atemporal. Impossível ser esquecido.

Vamos saudar o ano que está para nascer com sua “Receita de Ano Novo”!

MTP



Receita de Ano Novo

Carlos Drummond de Andrade



Para você ganhar belíssimo Ano Novo

cor do arco-íris ou da cor da sua paz,

Ano Novo, sem comparação com todo o tempo já vivido

(mal vivido ou talvez sem sentido);

para você ganhar um ano

não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,

mas novo nas sementinhas do vir - a  - ser;

novo

até no coração das coisas menos percebidas

(a começar pelo seu interior),

novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,

mas com ele se come, se passeia,

se ama, se compreende, se trabalha,

você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,

não precisa expedir nem receber mensagens

(planta recebe mensagens? Passa telegramas?)

Não precisa

fazer lista de boas intenções

para arquivá-las na gaveta.

Não precisa chorar arrependido

pelas besteiras consumidas

nem parvamente acreditar

que por decreto de esperança

a partir de janeiro as coisas mudem

e seja tudo claridade, recompensa,

justiça entre nos homens e as nações,

liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,

direitos respeitados, começando

pelo direito augusto de viver.

Para ganhar um Ano Novo

que mereça este nome,

você,  meu caro, tem de merecê-lo,

tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,

mas tente, experimente, consciente.

É dentro de você que o Ano Novo

Cochila e espera desde sempre.




Saudosismo X Deficit de Atuação Temporal






A tão repetida frase do nosso saudoso Ataulfo Alves: eu era feliz e não sabia...  tem tudo a ver com a minha vida de criança  em São Pedro dos Ferros. Já  naquela época, eu gostaria que acontecessem  algumas mudanças, mas sabia  sim,  que era feliz mesmo sem elas.
A vida simples  muitas vezes até difícil nos deixava mais livres e puros. Doce vida, previsível e sem os medos e inseguranças de agora. Se compararmos com a saturação de informações e apelos que nos envolve e nos afeta física, mental  e espiritualmente nos dias atuais, não teremos a menor dúvida, vale a citação.
Sem preocupar qual pizza pedir ou outro delivery qualquer, mamãe assava uma broa de milho, fritava biscoitos, sonhos, improvisava. Um bom mexido também resolvia e nos deliciávamos.
Pequenos avanços, aconteciam aos poucos, gerando satisfação por muito tempo. Como quando chegou o calçamento das ruas e tivemos uma melhoria que era incontestavelmente prioritária. Andávamos ou na lama ou na poeira. Isso mesmo, como nos filmes do velho oeste.
Talvez se as mudanças ocorressem mais lentamente, os danos seriam menores e mais fáceis de se contornar e adaptar.
Progresso e mudanças são maravilhas em nossa vida, indiscutivelmente. Não suportaríamos viver sem as tecnologias que nos trazem facilidades e satisfação. Mas gosto de comparar, mesmo parecendo saudosista demais. Talvez seja por ter vivido fases tão diferentes e que ao se confrontarem com  o hoje nos deixam um gostinho de saudade, uma vontade de sentir tranquilidade e um saldo de tempo que agora nunca temos  suficiente. O relógio parece correr e sempre que olho para ele está muito mais à frente do que eu esperava. Só pode estar acompanhando a expansão do Universo. Como não consigo mais correr tanto, escrevo para justificar o que chamo de meu deficit de atuação temporal...

Martha Tavares Pezzini
Dez 2012