O poder que não temos
Gabriel Chalita
Recentemente, abracei uma amiga que perdeu seu filho, vítima de
acidente de carro. Ouvi sua dor. Acolhi suas razões pelo sofrimento.
Entre lágrimas, silêncios e algumas tantas palavras, ela me disse:
"Queria ter o poder de morrer no lugar dele, queria ter o poder de
trazê-lo de volta. Era jovem demais para morrer".
Eu apenas a abracei e disse algo
sobre o amor amado, sobre o tempo rico da convivência, sobre a partida. E
fiquei refletindo sobre o que ela dissera.
Quantas mães, se tivessem esse
poder, trocariam a própria vida pela vida dos filhos? Quantos amantes
fariam isso também? Quem ama, verdadeiramente, sofre com o sofrimento do
amado. Mas não temos esse poder.
Somos vulneráveis diante da
brevidade da vida. Um acidente. Uma doença. Uma queda. E partimos. E
quase sempre não temos sequer o tempo da despedida. Alguns, doentes há
um tempo, conseguem fazê-lo. Ou não. A verdade é que, mais curta ou mais
longa, a vida escapa de nossas mãos.
Quem tem fé acredita em uma
eternidade de amor. Acredita que não somos brinquedos que, velhos ou
estragados, são descartados. Quem não tem fé sofre um pouco mais. Mas
todos sofrem. A ideia de não mais abraçar o ser que amamos, de não mais
conviver, de não mais enlaçar as mãos e os olhares é, certamente,
incômoda.
Bem, se não temos o poder de
prolongar a vida, usemos um outro poder. O poder de dar significado à
vida. De não desperdiçá-la com bobagens e estranhamentos. Quantas
escolhas erradas fazemos. Quantas brigas. Quantas mágoas que cultivamos
pela ausência de maturidade. Tempo desperdiçado. Poderíamos nos ocupar
de contemplar mais a natureza, de dar mais atenção para uma prosa, de
poetizar nossa travessia.
A mãe, minha amiga, chorava de
saudade, não de remorso. O acidente levou-o prematuramente. Mas, no baú
das memórias, ele permanece percorrendo os sentimentos e a mente de sua
mãe. E, quando passar a dor profunda, ficarão os encantamentos de um
tempo que, embora breve, foi belo.