sábado, 12 de agosto de 2017

Viver, sonhar, lutar e aprender - Martha Tavares Pezzini



      

        





Crônica depois de revisão.MTP
 
     


      
   

               Viver, sonhar, lutar e aprender 

         Como toda mulher que já viveu um pouco mais de seis décadas... tenho a presunção de possuir alguma bagagem de sabedoria, lucidez, diria até, de um sexto sentido. Sou capaz de ler nas entre linhas, percebo muito rápido, segundas intenções, e não se iluda, posso até parecer ser de Vênus, mas  tenho um pé em Marte. Combati o bom combate em variadas épocas e posições. Não abandonei o gládio, o escudo, o elmo. Ah! A palavra.
         Há algum tempo, só Deus sabe quanto, fui menina tímida, pensadora e questionadora. Ainda que os questionamentos fossem restritos à minha cabeça. Sem Google, bibliotecas e tantas fontes acessíveis agora, somente a sabedoria, principalmente a materna, para elucidar alguns, já que a maioria deles ficava arquivada, para, quem saberia? - um dia! Mais um pouco de tempo, curti o romantismo água com açúcar, às vezes, embalado por alegres musicais dos anos cinquenta/sessenta. Como desejava dançar daquele jeito e com aquelas roupas maravilhosas e brilhantes. Confesso, foi meu sonho maior. Daí, bailei, em bailes do Clube e horas dançantes ao som de orquestras e conjuntos, que hoje se chamam bandas. Mas o privilégio de ter vivido o tempo dos Beatles e da Jovem Guarda, ninguém me tira.
        Deixo aqui uma lacuna. Vocês preencherão com a imaginação, facilmente, se assim lhes aprouver... Muitos chavões. .. vamos em frente! Sem ter tido tempo para pensar, saio da máquina de escrever eletrônica, para a era virtual. O computador e eu nos entendemos logo ou  pelo menos, continuamos tentando nos entender. Há controvérsias. Como apanho desse tirano. Tudo que faço aqui, que é onde estou agora, é no improviso. Costumo dizer que é na marreta. Meu filho, técnico e fera nessa área, se espanta comigo: andei mexendo, é assim que me expresso, até com Photoshop e do autêntico, comprado! Desistir, jamais. Já consegui digitar e publicar dois livros e o terceiro está sendo revisado por mim, no computador, claro. Tenho blog, estou direto no Face e não entendo como algumas amigas vivem sem tudo isso. Não gosto do WatsApp. Viciei nas telas e teclas maiores. Celular, uso muito mal, para falar rápido com minhas filhas e chamar o UBER.
        Sempre adorei viajar. Nada mais excitante do que aquele movimento de aeroporto, depois esparramar no hotel, sair sem saber o que ver ou comer! Por motivos alheios à minha vontade não tenho viajado. Mas quando minha filha me disse que teria uns dias livres e perguntou-me onde eu gostaria de ir, talvez, supondo que eu escolheria uma linda e tranquila paisagem bem das nossas, respondi sem hesitar: - Vamos agendar Nova York.
         Cá entre nós, tudo isso é luta contra o tempo inexorável e cruel. Inexorável é bem retrô... Mas é o que sou, linguagem, conceitos e preceitos, figura e estrutura. É quando a gente inventa de escrever e nos escritos acaba inevitavelmente, RETROagindo!
              Martha Tavares Pezzini

terça-feira, 25 de julho de 2017

Degustando novo livro - Geraldo Roberto da Silva


 Geraldo Roberto da Silva - Artista Matozinhense, radicado no Rio Grande do Sul. A página é sua. Hoje Dia do Escritor somos brindados com as nuances do florescer do jatobá. Parabéns! 
MTP


"Me permite, Martha, usar este espaço para propor uma degustação do meu novo livro (quase pronto), chamado "Quando o jatobá floresce"?
Cada vez que eu publico, eu ato um nó do compromisso, não me permitindo desistir. Por isso faço isso agora, assumindo meus compromissos. O livro será um texto de ficção com mais ou menos 250 páginas, e pretendo, se não houver nenhum entrave, publicá-lo, no máximo até o primeiro semestre do ano que vem".
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Prólogos
Vida longa? Por que eu? Por que os que necessitaram, que mereceram muito mais ter sua continuidade, não puderam viver tanto? Essas vidas foram podadas como essas árvores de copas quadradas aqui em Paris. Moisés, sobretudo, merecia mais. Não merecia ter a continuação de seu caminhar impedida porque ele seria uma pessoa útil no mundo. Foi levado muito cedo. Cumpriu muito menos do que podia, e a sombra da morte apagou a luz dos seus olhos. Pesaroso lembrar isso!
Penso diariamente, do alto de minha velhice, nessas vidas perdidas: Moisés, Martin, tão heróis... Por que G ficou? Por que tenho eu setenta e quatro anos? Por que alguns foram contemplados com graças paralelas como se houvesse uma lei divina de compensação? Tenho essa angústia, principalmente agora, vivendo a solidão que este cinza do céu parisiense me faz sentir. Por que estou em Paris? Fuga? Às vezes acordo com esta pergunta grudada em minha mente e arrasto-a comigo durante todo o dia, qual um peso que se converte em grilhões para as minhas pernas tão cansadas.
Mundo, mundo, vasto mundo... Drummond me persegue!
Enxergo daqui, da janela, o Jardin des Tuileries. Vejo a margem direita do Sena, entre Place de la Concorde et L'Arc de Triomphe du Carroussel. Caminho aí sempre que posso. Hoje Dominique vai comigo. Vai me cobrar com certeza, como sempre faz quando caminhamos, decisões sobre minha literatura. Fará isso hoje, como fez ontem, como fez anteontem... Tento ter a paciência que um quarto casamento exige.
Aqui, por sorte, tenho Edésio Novaes, que é, posso dizer, a maior autoridade em línguas estrangeiras, do meu círculo de relações. Domina inglês, francês, alemão, espanhol, italiano, sueco, “cearense” e um pouco – eu diria suficiente – de japonês e mandarim. Mora em Paris e –coincidência agradável – é meu vizinho e tornou-se meu amigo. Foi um dos primeiros a acompanhar – desejo dele que fosse assim – cada parte deste livro, da redação final, e até mesmo os pedaços que descartei.
- Isso faz parte do jogo – disse-me um dia. - Melhor conhecer a oficina em todos os detalhes, inclusive a bacia dos descartáveis e as estopas sujas de óleo.
Ele me ajudou, traduzindo para Dominique um resumo da história, e se sentiu feliz, disse-me, pois pode acompanhar o desenrolar do enredo a partir do pacote inicial com tudo que usei e descartei. Este resumão – primeira seleção – encadernada, eu trouxe comigo a Paris onde, decidi, terminaria a escrita. Edésio, educado que é, leu tudo com paciência carinhosa e no final me disse que não recomendava mais nada e que estava tudo muito bom.
Foi dele inclusive a iniciativa da promessa de ir comigo um dia até Rozgrud, a outra “ponta do triângulo”, pois se sentia no direito de participar dessa descoberta. Importante: guardo aqui, por enquanto, o mistério do “triângulo” para provocar o leitor e atiçar sua curiosidade.
Ah!... em tempo: muito vai se ver aqui, a mistura de assuntos e de tempos. Tanto poderemos estar no agora, no momento da escrita, quanto o tempo da ação poderá ser o passado e até, quem sabe, uma previsão futura. Literatura pra mim é isso. Coragem para misturar tempos e coisas é pra poucos. Meu leitor que corra atrás, porque nem tudo neste livro será açucarado ou didático e paternalista. Convidarei, vez em quando, que o leitor adiante-se ou retroceda comigo, pois isso ditará o ritmo, quebrando a pasmaceira tão comum em tanta coisa que a gente lê por aí. Reconheço... tem um pouco de jornalismo nisso sim.
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618, Rue de Rivoli, 75001 é meu endereço de Paris. Aos poucos me acostumo com a cidade e com a língua que não domino bem ainda, coisa contraditória pra quem um dia foi correspondente internacional. Caminharei em direção a Place de la Concorde onde me encontrarei pela segunda vez com Moïse Lafayette... exigência dele, um ano depois do encontro em Montevidéu.
Entregar-me-á um envelope, falará pouco com sua voz fanha e me dirá: “’Lizes chez vous.”. Virará as costas e irá embora sem se despedir. Certamente será assim, sempre do jeito dele, sempre do jeito de todos, nunca do meu jeito.
E Dominique me cobrará na volta: Et alors, avez-vous décidé? Estará se referindo, é claro a algo que não decidi ainda, porque não sei se aproveitarei este texto que escrevo agora, neste momento. Quererá também saber se decidi como assinarei, uma pequena dúvida, não tão séria, mas que às vezes me incomoda como uma coceira. Ela me dirá, certamente, até antevejo: “Saulo! Ça doit être. Son vrai nom! J’aime tant la sonoritá ouvert de Saulo!” falará assim com os ditongos abertos, o “a” espocante como uma bolha que estoura e o “u”como um sopro, além da charmosa invasão do circunflexo no “o” final (“Saulô”). Tentará impor isso.
Mesmo assim, sabendo-as invasoras, sempre procuro uma mulher, uma companhia. É necessário nunca estar só. A solidão engendra a melancolia.
Sinto um arrepio, doem-me as artroses. Adapto uma frase de Proust: “gemo como um galho ao vento de outono.”. Respiro com a dificuldade de um fole furado. Essa última frase é minha.
Sou assim. Voltarei para casa e acenderei a lareira e abrirei o envelope de Lafayette. Sentirei a coceira de botar o pé no mundo e fechar um ciclo terminado ontem, meia-noite, quando fui dormir. Hoje, quando Dominique voltar na hora do almoço me encontrará ali, pensativo, cogitando que tudo começa de novo, agora. Estarei comendo tangerinas e jogando as cascas no fogo. Gosto de fazer isso: vê-las inchar com o calor, as bolhas na parte branca estourando, fazendo um “ploft” baixinho que poucos ouvidos escutam.
Ela me perguntará: escolheu? E eu poderei dizer que sim: assinarei Saulo, Saulo Agnelli, meu nome verdadeiro. Esconderei, a princípio, os comichões que os documentos de Lafayette me causaram.
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sábado, 22 de julho de 2017

Só porque hoje é sábado - Martha Tavares Pezzini






 Meio parodiando Vinícius e homenageando Basilina Pereira, saiu assim de improviso, ainda sujeito a chuvas e trovoadas. MTP

                                          

Só Porque hoje é sábado

Há sol lá fora,
o frio quase foi embora.
O trânsito está meio parado,
Em um dia ensolarado,
Só porque hoje é sábado.

Pensamentos fervilham,
Não encontro meu lugar.
A solidão pesa mais,
O vento é mais gelado,
Só porque hoje é sábado

Invento artimanhas
Pra esquecer os desamores.
Cuido de flores,
De livros desorganizados,
Só porque hoje é sábado

Não quero sair de casa,
Zanzar entre pessoas.
O shopping está lotado,
Ė um total desagrado!
Só porque hoje é sábado

Vou almoçar por aqui
O que tiver para comer.
Um vinho pra aquecer,
Nada muito complicado,
Só porque hoje é sábado

Queria um poema que chegasse cedo
Como o de Basilina,
Igual, tão belo é inspirado,
Um poema inigualável,
Só porque hoje é sábado.

Martha Tavares Pezzini

terça-feira, 11 de julho de 2017

segunda-feira, 10 de julho de 2017




 Quintana, Poesia!

Para provocar inquietude
Mário Quintana

A vida é uns deveres que nós trouxemos para fazer em casa
Quando se vê, já são seis horas: há tempo...
Quando se vê, já é sexta feira...
Quando se vê, passaram sessenta anos...
Agora é tarde demais para ser reprovado...
E se me dessem – um dia – uma outra oportunidade,
eu nem olhava o relógio
seguia sempre, sempre em frente...
E iria jogando pelo caminho a casca dourada
E inútil das horas.

Do livro: Para viver com Poesia

terça-feira, 16 de maio de 2017

Escritores esquecidos, desmazelo cultural - Valdivino Braz


Perambulando e pesquisando deparo com esse artigo. Sendo uma interessada no assunto e admiradora do inesquecível Nilto Maciel, cheguei ao Valdivino Braz. Esse artigo foi publicada há algum tempo. Mas nada mudou de lá para cá. Peço licença ao Valdivino para dedicar a postagem do seu trabalho, primeiramente, claro, a ele; em segundo lugar ao Nilto Maciel que tanto batalhou por esse tema e em terceiro lugar ao Rogério Zola Santiago, outro batalhador. 
MTP
Escritores esquecidos, desmazelo cultural.
Autores ignorados pela mídia, editoras e academias motivam pesquisa no Ceará
 Valdivino Braz
Especial para o Jornal Opção

“Você conhece Moreira Cam­pos? Já leu al­gum livro de­le?”. De Fortaleza, Ceará, recebo, por meio de e-mail, estas perguntas do amigo e primoroso escritor Nilto Maciel, imbuído de oportuna, pertinente pesquisa “para mostrar o quanto ignoramos nossos escritores menos divulgados pela mídia, pela Academia, pelas editoras, etc.” Com efeito, agora que se apruma a questão, volta-nos à memória o nítido nome de Moreira Campos, a exemplo de outros que vão sendo insidiosamente esquecidos ou simplesmente ignorados.

Aponham-se o débito editorial, a omissão das Academias de Letras e outras instituições (universitárias, inclusive) ou entidades culturais, como (sejamos francos) a UBE nacional e suas seccionais, além dos próprios escritores, ocupados consigo mesmos, zelosos de suas “carreiras literárias”, senão que apenas indiferentes à questão dos colegas na berlinda ou carruagem do tempo. A saber-se até onde sobreviverá a memória literária sob a tutela dos confrades. E como acudir a todos, a tantos, a quantos, na poeira do tempo, nos desvãos da desmemória?

Claro, há o fator tempo, os anos que passam e germinam o musgo ou a pátina do esquecimento, a par com o volume de valores emergentes e também o enxurro e a mesmice de obras de baixo teor ou mediana qualidade, nacionais e estrangeiras, que incrementam a dinâmica do mercado editorial e alimentam-lhe a ganância. Frenéticas, as editoras exploram o filão e abocanham o lucro, impondo aos autores nacionais as suas míseras condições de acolhida e comercialização.

Mas há, sobretudo, um certo desmazelo cultural no País, inerente ao resgate de autores valiosos, de ontem e de sempre. O descuido, a negligência, a ignorância. E quase ninguém se manifesta a respeito, não se faz nada de produtivo e necessário neste âmbito cultural, daí a pertinência da iniciativa de Nilto Maciel. Não deixa de ser também um gesto solidário, por solitário que seja, entreabrindo a cortina do silêncio e da empoeirada e surda indiferença.

A pesquisa de Nilto começa por sua terra-natal, o Ceará, com Moreira Campos, e bem sabe ele da extensão do problema a outros estados brasileiros. Uma certa mídia por vezes sacana (canalha, mesmo), de alguma forma irresponsável, babujando (babando, corrompendo a noção de valor) sobre obras-abobrinhas, chinfrins, ou meras e momentâneas mercadorias, de rápido consumo. Supervalorizando algumas baboseiras estrangeiras, entretenimento de cunho imediato, feito “fast food” (Coma!, coma!), sobretudo para o ingênuo consumo jovem ou de um público desinformado, desprovido de senso crítico, até beirando o ridículo. Entupidos de “comida” do entulho “cultural” alienígena, já não bastasse o entulho doméstico, e comporta(mentalmente) idiotizados por maneirismos estereotipados, numa repetida forma de fuga ao natural de si mesmos.

Coisas da indústria cultural de massa (como se diz) e de entretenimento, (re)pasto para o rebanho automatizado, movido a gasolina, adrenalina, estrogênio e testosterona. Ops!, que agora estou extrapolando, e me desculpo, que a coisa também não é bem assim,  sendo até “natural” que seja como é, e já também por termos sido (nós, os antigos) o  que hoje nos desagrada ao olhar. E o que vemos? Espelho, espelho meu, como você é feio! Franqueza honesta, como essa agora, não faz mal a ninguém. E por ser assim a “naturalidade” das coisas, tais como são, imagine-se se aqui eu começasse a falar de outros tipos de “combustíveis”, nefastos estimulantes à degradação, e maior o problema social, o contingente humano à míngua de assistência do poder público. Bem entendido, seria uma droga que eu assim falasse, pois não? Mas é disso que estou falando! (das drogas), e não estou copiando bordão de comediante “stand up” na TV, que já copiou de outros, possivelmente de algum filmeco norte-americano.

Por outro lado, amesquinha-se a mídia provinciana e já não divulga (ou divulga mal, até subestimando) os escritores emergentes, de qualidade promissora. E novos autores ou aqueles que vão se firmando com a literatura, ainda enfrentam a humana pequenez de uma gente miúda (da mídia impressa e televisiva), que se pauta por meras idiossincrasias e boicota a divulgação. A média, a mídia, o meio, a medida, à média luz. Os diversos meios de comunicação e difusão sociocultural, aos quais se agrega a frenética informação digital. A Rede. Ou pega-moscas?

Editoras há tão-somente esfomeadas por novidades de momento, ávidas de lucro (certo, estão no ramo e não vão perder a oportunidade), e por aí relegam ao limbo boa parte da nossa riqueza literária. E ainda as Academias de Letras, confrarias girando em torno dos próprios umbigos, sem maior zelo pelo acervo literário de qualidade — sem falar que, lamentavelmente, acolhem como membros algumas pessoas pouco recomendáveis ou representativas (políticos de caráter nada ilibado, por exemplo), e até bruxos escritores de pastiches, com mercado garantido, em detrimento de literatura mais qualitativa.

E por acaso se pensa que esse público que mal lê e essa parcela de juventude alienada estejam se importando com isso? Estão se lixando, como de praxe. Mesmo porque os tempos são outros, e os escritores em questão são antigos, alguns dos quais não serão resgatados, infelizmente. Permanecerão lá onde se encontram, no limbo, de fato ignorados, esquecidos ou pouco lembrados. Oh, tempos! Oh, costumes, diria Cícero, que foi degolado e cuja cabeça e mãos foram expostas na tribuna do Senado de Roma, do qual era porta-voz. Morto a mando do cônsul Marco Antônio, seu rival político.

Já por primeiro, o governo de cada estado, bem como o Ministério da Cultura, têm parte na cadeia de omissões para com os escritores esquecidos, ou não? Ocorrem-me, a propósito, nessa questão de resgate literário, aquelas antigas publicações ou co-edições de livros pelo INL, ou também não? Imperativo o resgate e cultivo de autores como Campos de Carvalho (da Academia Cearense de Letras) e tantos outros de bom quilate e calibre, todavia olvidados.

Particularmente meio que enfarado com o enxurro e mesmice atual — ressalvadas as exceções —, e mais seleto com as leituras, venho buscando os sebos, (re)adquirindo obras e retomando leitura de alguns autores que aprecio, tais como José Condé, Adonias Filho, Ricardo Guilherme Dicke (acabei de resgatar o romance “Caieira”, edição antiga), Herberto Sales, Hermilo Borba Filho, José J. Veiga (contos de seus dois primeiros livros, que eu não tinha mais). E (acredite!) somente agora adquiri e vou ler o premiado romance “Emissários do Diabo” (edição de 1974) do pernambucano Gilvan Lemos; também dele, e com tamanho atraso, intento encontrar a novela “A noite dos Abraçados”, pelo menos. Estou em busca de reaver obras de Valdomiro Silveira, Autran Dourado e outros nessa linha do meu agrado. E agora que Nilto Maciel buliu no baú, sairei a campo(s) pelas obras de Moreira.

Deste autor cearense (traduzidos para o inglês, francês, alemão, italiano e hebraico), já uma vez, há décadas, tive em mãos o livro de contos “O Puxador de Terço”, que pretendo reaver. Sei de outros títulos de sua autoria, também em volumes de contos, como “A Grande mosca no copo de leite” e “Dizem que os cães vêem coisas” — aprecio títulos assim; a arte de um livro começa pelo bom título, chamariz para a leitura, sobre uma capa igualmente sugestiva. Além dos títulos já citados, interessa-me ler “Vidas Mar­ginais” (1949), primeiro livro de Moreira Campos, e daí “Portas Fechadas”, “Vozes do Morto”, “Os 12 Parafusos”, entre outros. Bem se vê que Nilto Maciel levanta a lebre dos autores ignorados, como também da literatura esquecida, e não para que seja morta, como nas caçadas, mas sim para ser revivida, e não também que esteja morta, estando viva. Um tiro certeiro, digamos assim, de Nilto Maciel. No alvo da acomodada consciência cultural brasileira.

Como tema para reflexão, fecho este arremedo de ensaio com as palavras de Gilvan Lemos, que dizia não deixar Recife por dinheiro nenhum do mundo, a não ser que fosse para voltar ao São Bento do Una, que ele tinha como o seu paraíso: “Tenho amigos escritores, mas não faço vida literária, isto é, não pertenço a nenhum ´grupo´, nenhuma academia, não tenho coluna em nenhum jornal etc. Prefiro criar canários de briga.”

É isso aí, creio. Publique-se e dê-se livre trânsito pelas cidades, a quem interessar possa.
Valdivino Braz é jornalista, escritor

quinta-feira, 4 de maio de 2017

O Labor Poético - Matusalém Dias de Moura

 Muito útil para os que já poemizam e para os candidatos que sentem o chamado da Musa!
MTP

O LABOR POÉTICO
Depois de muito estudar a arte poética, quase sozinho, autodidaticamente, e de praticá-la bastante, aprendi que o aspirante a poeta, antes de começar a escrever e publicar seus versos, precisa ler e reler, muito, os grandes mestres da divina arte da poesia, os clássicos e os modernos, para, de fato, a partir daí, se iniciar nos meandros e mistérios dessa sublime - mas difícil - arte e se intitular poeta.
Ler poemas de diferentes formas, em voz alta, também é imprescindível na formação do poeta; é uma espécie de prova por que passa o candidato, no permanente aprendizado das formas, ritmos e medidas dos versos.
E, para isso, é preciso, pois, ter sempre ao alcance das mãos, e dos olhos, uma boa coletânea de poemas para, nos intervalos da luta pela sobrevivência, usá-la, lendo-a, recitando-a e estudando-a.
Além de constante leitura da grande poesia, também é aconselhável ouvir muita música o máximo de tempo que puder, se possível o tempo todo, com atenção: música popular, clássica, erudita, jazz, rock etc. É que a música ajuda a educar os ouvidos, ensina-nos o que é o ritmo.
A música instrumental, de boa qualidade e bem trabalhada é, a meu ver, a melhor para treinar os ouvidos do candidato a poeta. A mim, pessoalmente, me ajudou, e ainda me ajuda, muitíssimo, a dar ritmos a meus poemas.
Mas não basta só isso para se compor um bom verso, um poema de alguma qualidade literária.
Depois de algum tempo de aprendizado, lendo os grandes poetas, ouvido boas músicas e rabiscando os os primeiros versos que lhe vem à mente, num jorro de inspiração, faz-se necessário, ao poeta, suar a camisa, transpirando o máximo possível, como em qualquer outro trabalho, reescrevendo o texto, inúmeras vez, durante um prolongado tempo, às vezes semanas ou meses, com lápis e borracha na mão (hoje, computador), escrevendo, apagando tudo e escrevendo, novamente, até se chegar a um poema de razoável valor literário, isto é, que contenha boa poesia.
O poeta gaúcho Joaquim Moncks, em um curto trabalho de crica literária, nos adverte que "o que faz o poema ser poesia não é a inspiração e, sim a produção final do segundo momento, o da transpiração".
Comigo acontece assim: sempre tenho que trabalhar muito as palavras, amansando-as e ajeitando-as em seus corretos lugares. Só depois de um duro trabalhar, longo e persistente, é que abandono a feitura do poema, porém jamais o dou por terminado. Sempre que o releio, acrescento ou suprimo algo.
(Matusalém Dias de Moura)