Chuva de felicidade
Começou a chover agora à tarde. O som da chuva, calma e sem trovões, soa agradável aos meus ouvidos. Dá vontade de largar tudo e me deixar envolver pelo clima de paz que vem com ela. Uma invasão de recordações me assaltam sempre na presença de aromas e sons. Sinto ainda, aquele cheiro que impregnava o ar da minha casa, quando as telhas secas iam se encharcando, ao começar a primeira chuva.
Vejo-me criança, junto à minha mãe e irmãs deixando tudo de lado para nos entregarmos àqueles momentos se acontecia um temporal mais forte. Na impossibilidade de olhar pelas janelas, sem vidraça, nossa curiosidade era aguçada para ver as enxurradas e a água que descia do telhado o que nos fazia arriscar pequenas aberturas, fechadas às pressas pelas rajadas de vento e água que nos assaltavam.
Aqueles aguaceiros que caiam à tarde faziam surgir as goteiras no telhado sendo necessário colocar baldes, bacias e o que mais houvesse para salvar o chão ou algum outro móvel. E o plim, plim era um novo som sendo gravado em nossos ouvidos como notas de um piano. Como complemento surgia o coral das nossas vozes. Gostávamos de cantar. Talvez porque fossemos felizes sem saber.
Após o culto à chuva, mamãe fazia sonhos ou biscoitos fritos para acompanhar o café. Tudo parecia estar combinado e já acontecia com um propósito: gravarmos aqueles momentos e trazê-los para o hoje quando os sons da chuva já não são mais os mesmos e aqueles concertos de orquestra e coral não acontecem mais. São ecos de um tempo em que a felicidade podia estar num canto, num aconchego, na chuva, no estar junto. A felicidade era convidada a tomar parte em nossa vida em qualquer oportunidade. E chegava sem complicação, sem rodeio. Ela também era simples. Como nós.
Martha Tavares Pezzini
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