“No espaço que a janela me permite visualizar, deparo com um
cenário que me lembra filmes que se passam em planetas desconhecidos onde construções
gigantescas são panos de fundo e onde não vemos vestígios de vida. Somente os tripulantes
das naves. Tudo está parado. Raramente passa alguém, parecendo perdido, oculto
pela máscara ou uma moto com bagagem para entregar alguma encomenda às pessoas
que se resguardam no isolamento de sua residência. Todo o mundo está sendo castigado por essa pandemia e o Brasil por sua enorme extensão territorial tem sofrido ainda mais. Ignorando a realidade, os
pássaros cantam e o sol brilha. Nós, sem podermos ignorá-la vamos vivendo nesta cruel nesga do tempo, que foi inserida
no contexto da nossa realidade humana. Já perdemos a conta dos dias que já se
passaram enquanto vamos tentando nos enganar pensando que vai acabar. Planos,
projetos, sonhos, tudo está em off, numa nebulosa. Não ousamos lhes dar formas,
impossibilitados de lhes conhecer a temporalidade. É uma vida provisória, como
pensávamos logo no início. Mas o provisório se prolonga e vamos vivendo assim, entre cuidados, privações,
medos, inseguranças. Sofremos com a dor disseminada por todo mundo, país,
cidade. E ainda somos torturados pela divisão e alienação entre as pessoas
instigadas por objetivos nada científicos ou humanísticos. Infelizmente, dói ver que nem todos conseguem agir numa sã consciência, e seguir responsavelmente as normas de segurança tão necessárias não somente para si, mas principalmente para aqueles que talvez sejam mais vulneráveis, os chamados grupos de risco. Principalmente quando já sabemos que todos somos igualmente, um risco e que o vírus age imprevisivelmente em cada organismo.
Como é bom saber que não nos fazem nenhuma falta as idas aos shoppings centers, as tentadoras compras em promoções que julgávamos imperdíveis, numa inconsciente ou não, imersão ao mundo do consumo. O isolamento só maltrata o coração pelo distanciamento das pessoas amadas. Também, o desejo de fazer uma viagenzinha, que ninguém é de ferro... Isto sim, é desolador.
Resta-nos pensar que não sairemos os mesmos desta pandemia. Os dois anos, e que sejam só dois, passados a lutar e esperar, para quem já conta o número dos prováveis anos que tem pela frente, será um grande prejuízo. Entretanto não podemos negar que alguns valores serão acrescentados à bagagem de cada um como ocorre com tudo que vivenciamos, principalmente o sofrimento."
Martha Tavares Pezzini
BH, 24 de abril, 2021
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