quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

 


NÃO CELEBRO ESSE NATAL

Paschoal Motta

... e continuo conferindo, a cada final de ano, incoerências nas propagandas e promoções com gancho no Natal de Jesus Cristo. E, nesse imbróglio, se repete a mesma toada, nos meios, com apelos para compra e consumo disso, daquilo e quejandos para presenteio a quem possível. E pipocam, em rádios, tevês, revistas, jornais, placas, vitrines, redes sociais, nisso e no mais com ofertas de engambelar criar necessidades; atiçam o potencial comprador com o ter de entrar na compração de um tudo a qualquer custo (sem trocadilho).

De entremeio e de lambuja, compõe a cena a impreterível figura de Papai Noel que invade e toma conta do pedaço, com o que tem de direito. Reforça a espera de presentes dele para meninada geral... rôrôrô... Esse personagem integra a saga infantil na travessia das ilusões necessárias

Aliás, Natal de quem tão importante assim para merecer tamanhos e ruidosos festejos e apelos comemorativos? Só pode ser “o cara”, esse cara, o tal, o degas. Mas, quem de nome qual?

As peças publicitárias e promocionais se manifestam, em todos os meios, neste tempo de costumeiras festanças; se esquecem ou ignoram ou evitam o nome do aniversariante bimilenário. Ou mesmo, vai ver, tais cérebros desconhecem a vetusta tradição cristã sobre um Menino nascido numa modesta comunidade de um modesto país do Oriente Médio, de mãe e pai humildes, uns sem beira nem eira. E que esse Menino mudará até a datação das eras para antes e depois dele, em quase inteiro Planeta; e suas mensagens de harmonia, doação, caridade para com o próximo serão quase nada acatadas e geralmente distorcidas por obscuras intenções.

Conforme conveniências tantas, Jesus Cristo, com a mansidão que demonstrou e pregou, há mais de dois milênios, atende também por Messias, Nazareno, Salvador, Redentor, Cordeiro de Deus, Filho do Homem, Rei dos Reis, Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, Mestre entre outras mais de três centenas de apelos. E vem rendendo ganhames de milhões e bilhões de dinheiros no balcão do egoísmo, da ganância desmedida do consumismo, da insensibilidade, da mentira. Vale sempre de isca gratuita, por oportunismo de pretensos seus  representantes, para pescaria de mais e mais incautos seguidores.

Usam e abusam do nome dele. E como abundam esses abusos obtusos nestes confusos e noturnos tempos, tais modernos traficantes em nome de JC. Haverá chicotes bastantes para tantos nesses templos de absurdos?

Curto, sim, simpatia pelas Boas Novas do Nazareno, pelo dele registrado nos quatro evangelhos selecionados entre dezenas deles. Serão sempre oportunas motivações para bem viver pessoal e conviver no geral. Mesmo tendo sido escritos, conforme os entendidos, quase cem anos depois da passagem desse Humanista iluminado pela Terra, e imagino que ele teria degustado o vinho de Sidarta Gautama, na taça da paz do amor, da serenidade, do perdão, da compreensão entre as pessoas e as demais formas da Natureza.

Nestes dias natalinos, sempre me voltam alegrias na construção do Presépio, para simbolizar o palco do Nascimento de Jesus Cristo. Para tal proeza, era comum em cidades, como em São Pedro dos Ferros: desde a cata de areia branca em determinados barrancos e placas de limo em taludes de pedra em lugar úmido; os demais componentes surgiam produzidos por nós mesmos de casa numa festiva afoiteza. 

Armava-se o dito,  na sala de visitas, na representação duma cidadezinha com casinhas de cartolina branca; uma gruta inventada com pó de pedra e colada com grude de polvilho em papel grosso, ou pedaço de saco de aniagem, ou de saco de cimento; ali, o Menino ia nascer... Ali, deitadinho numa manjedourinha com restos de capim seco aparecendo por debaixo dele, rodeadinho pela santa mãe, Maria, e o santo pai, José, mais um boizinho, um burrinho, estáticos, vigiam, guardam e esquentam com seus bafos o Nenenzinho com as perninhas rechonchudinhas de fora...

Ahhh, não esquecer os três reis magos acudindo pra lá com presentes de ouro, incenso e mirra... Tais personagens eram adquiridas prontas.

Minúscula candeia a óleo de mamona vela o ambiente dia e noite... Tudo num encantamento de nem saber descrever.

No bolo dessa azáfama, o preparo dos doces em calda, de limão, de figo, cidra; a rabanada dourada de gema de ovo. As gostosuras fartavam; os dias do dezembro entoavam sensações gustativas e piedosas...

O cheiro inigualáavel do limão cozinhando perdura ainda aqui e agora...

Meia-noite, Missa do Galo somente para os adultos. Ai que vontade de ir conhecer que tipo de galo cantava lá... A criançada precisava dormir cedo, para, de manhã, conferir o brinquedo no sapato atrás da porta da sala, pedido e sonhado ano inteiro, a Papai Noel e ao Menino Jesus.

Dia 25. Era saltar já da cama, o mais cedo. Naquela manhã, a criançada saia das suas casas em bulhenta agitação com os mais variados presentes. (Um vizinho meu ganhou um crucifixo de alumínio...)

E, pés descalços, mãos abanando, outras meninas e outros meninos babavam com aquilo, sem entender porque Papai Noel não levava tais presentes para elas...

Com os adultos, as esbórnias, de um dia para o outro, acontecem na base do pernil suíno, da leitoa assada, da carne de boi, de cabrito, de peru, até do franguinho de quintal. Isso e aquilo, regados a vinho, cerveja, refrigerante, limonada caseira, cachaça e quejandos.  

Até agora, não atino com esse criar, engordar e matar animais, ou encomendados prontos, para celebração do nascimento de um Menino considerado Deus...

Isso na memória de poucos remanescentes; e o aniversariante vai-se diluindo numas sombras de alheamento, desinformação, insensibilidade...

Vamos que vamos, sambando numa corda bamba, de um circo estrambótico, caótico, consumindo e consumidos...  mas felizes pra dedéu.

 E, no meio de tudo, um mortífero vírus vigia na espreita...

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(PM, escritor, jornalista))

Promoção: Phrasis Assessoria Texto Consultoria //seu texto em melhores mãos depois das suas.

São Pedro dos Ferros, dezembro, 2021.






sexta-feira, 17 de dezembro de 2021

Três Poemas: Basilina Pereira - Paschoal Motta - Sergio Donadio

 

                I

O QUE DIZ O SILÊNCIO

 

No vértice da palavra

a ausência do som é o nó

que trava o sentimento.

A flâmula que se debate ao vento

risca o espaço, quer atravessar a fenda,

embrulha o tempo e, ainda assim,

só o relâmpago de um olhar acuado,

que devora o momento de um só gole.

Tudo está ali e nada se pode ver.

A vontade embebida em gestos contidos

é a folha que o medo engoliu.

E a pedra, que não está no meio do caminho,

mas solta à margem do penhasco.

 

Basilina Pereira

 

                   II

R E V E L A Ç Ã O

Paschoal Motta

 

Que canção basta entoar

Para compor a madrugada?

A manhã, outra vez,

Nasce aí onde relembro.

Minhas mãos se queimam

Por sua pele de pétala.

As setas das lágrimas

Cobrem de fogo meus olhos

Só por rever o seu corpo.

De vigília, sei dos seus sonhos,

aí, nesse pouso de sombras.

Seu nome reescrevo para gravar

nas penhas de sua ausência,

faca afiada de esperas,

e revelar quem somos;

que de argila somos fruto

de passados e de angústias,

sabendo que não seremos

mortos para todo e sempre:

A lembrança em nossos ombros

Suporta o que nos iluminará

Com os signos da esperança

Na carne inteira de ansiedade.

 

                     III

  Tempo de esperas

 

A esperança me abraça,

A esperança não constrange,

Inda cultivo saudades

D’onde semeei andanças...

A esperança me abraça

Ante a lembrança estranha

De um tempo que esfumaça

Entre feitos e defeitos,

A esperança não constrange

Esta visão esparsa

Das formas que fui levando,

A esperança me abraça

Dando-me novas entranças

Ao sentimento esparso

De mim em tempo criança...

 Sergio Donadio

 

 

 

quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

Revelação - Paschoal Motta

 

UM P0EMA PARA SUA EMOÇÃO/ 50

“Uma ideia inteira muda porque uma palavra mudou de lugar...” (Pablo Neruda)

R E V E L A Ç Ã O

Paschoal Motta

 

Que canção basta entoar

para compor a madrugada?

 

A manhã, outra vez,

nasce aí onde relembro.

 

Minhas mãos se queimam

por sua pele de pétala.

 

As setas das lágrimas

cobrem de fogo meus olhos

só por rever o seu corpo.

 

De vigília, sei de seus sonhos,

aí, nesse pouso de sombras.

 

Seu nome reescrevo para gravar

nas penhas de sua ausência,

faca afiada de esperas,

e revelar quem somos;

que de argila somos fruto

de passados e de angústias,

sabendo que não seremos

mortos para todo o sempre:

 

A lembrança em nossos ombros

suporta o que nos iluminará

com os signos da esperança

 

na carne inteira de ansiedade.

 

(de Estações da Ausência, esgotado)

 

Esta edição, enviada diretamente a 940 endereços, homenageia a memória  LUIZ NUNES (BALALAICA), taxista, compositor e  seresteiro muito apreciado em São Pedro dos Ferros, Caratinga e região.

Promoção: PHRASIS Assessoria Texto Consultoria / Seu texto em melhores mãos depois das suas.

quarta-feira, 24 de novembro de 2021

Uma análise real - Martha Tavares Pezzini


 

         

Uma análise real

 

           Chegar aos oitenta anos é como atingir o pico de uma montanha após uma fatigante e arriscada escalada onde convivemos com  a perplexidade diante da ousadia, insegurança, medo, encantamento, desafios e surpresas.  Para escalar uma  montanha sempre há uma preparação dos instrumentos  necessários, instruções sobre como agir diante de obstáculos imprevistos e mais conhecimentos sobre eles. A  meta é somente uma: chegar ao topo.

            Já na estrada da vida é um pouco diferente. Somos surpreendidos frequentemente sem estarmos preparados. Vamos aprendendo à medida que vivemos com os erros e acertos.

           Sempre tive consciência do meu envelhecimento, mas sentia que a- inda  aguenta- ria os trancos e percalços com que a vida nos brinda, por mais uns tempos. Em todo esse tempo vivido, nunca tive a certeza de que chegaria tão longe. Tampouco que esse tempo se mostrasse tão rapidamente à minha frente e dizendo: - Olha eu aqui. Cheguei. - E nem contava com o imprevisto da cruel pandemia a roubar dois anos de quem já está a contá-los nos dedos.

             Ao ver a meteórica aproximação do precioso marco comecei a considerá-lo um divisor de águas um tanto estarrecedor. Não adianta tentar disfarçar, tentar novas indumentárias ou nomenclaturas.

            O prazer de viajar para onde quiser, por exemplo, ficou bastante comprometido. Não tenho o mesmo destemor, o mesmo arroubo. Desbravar o desconhecido, nem pensar. Sem companhia, ficou muito dificil e esta é sem dúvida, a pior parte das restrições, que já são muitas.  Não quero me enganar. Tenho que manter o bom senso.

           O que me salva é a escrita. É de onde sai o que está lá dentro e necessita vir à tona. É como conversar com alguém cujos olhos, por acaso, cheguem até esta página. O que escrevo é dirigido a ele. Este diálogo, porém, está sendo dificultado. Com dois livros  para publicar e as editoras informando que não estão recebendo rascunhos para análise - o que pode ser desculpa para não perder tempo com escritor desconhecido.

            Ler foi sempre uma grande satisfação além de resposta, enriquecimento e complementação aos meus anseios de conhecer e saber mais. Quanto mais antigas foram as leituras, mais emoções acumularam em minha bagagem.

             Em meu caminho aconteceram menos desencontros do que encontros. Por onde passei conheci pessoas inesquecíveis e insubstituíveis. As demais serviram de referência ao estabelecer uma comparação.

             Viver é aprendizado: se muito vivi, muito aprendi tanto com as situações adversas como com as favoráveis.

               Assisti às várias  transformações em todas as áreas humanas, políticas e sociais. Do que vivi, aproveitei todas as oportunidades ainda que nem sempre tenham sido tão abundantes.

              De tão longe até aqui, sobejaram bênçãos que me propiciaram alçar os degraus que me proporcionaram cada um, a aprendizagem para prosseguir.

              Os calçados estão gastos, mas a mochila e o coração estão repletos dos dados recolhidos e das emoções vividas.

 

Martha Tavares Pezzini